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Infrações e sanções administrativas no PL 4253/2020

Tem-se na nova lei, uma ampliação do rol de práticas do particular passíveis de serem punidas, em contraposição à legislação anterior (arts. 86, 87 e 88, da Lei nº 8666/93), estabelecendo outrossim um regime punitivo mais rigoroso que o anterior, que se justificaria como forma de compensar uma desburocratização promovida pela nova lei no acesso aos processos de contratação pública. Além disso, o legislador atual demostrou uma preocupação em tipificar de forma mais objetiva as condutas sujeitas à sanção. Todavia, ainda pairam críticas a respeito do grau de precisão das infrações administrativas, tendo em vista que ainda persistem lacunas na definição de certas situações designadas por conceitos pouco determinados, como por exemplo o “comportar-se de modo inidôneo”.

O PL trata das infrações e sanções administrativas, buscando a retribuição do ilícito na esfera administrativa, o que não exclui a indenização pelas perdas e danos produzidos, consoante destacou expressamente o art. 155, § 9º. Essa noção é reforçada em parte no art. 118 ao tratar da reparação de danos às expensas do contratado.

As infrações foram previstas nos incisos do art. 154. Nos três primeiros incisos o legislador trata da inexecução contratual, com a descrição do simples parcial inadimplemento e o agravamento paulatino de condutas, que comprometam outros serviços públicos ou que descumpram totalmente o avençado. O inciso IV diz respeito à apresentação da documentação pelo particular no certame, em adequação aos requisitos do edital e da positiva relação do agente econômico com a coletividade. Os incisos V e VI estão no mesmo contexto dos incisos I a II, diferenciando-se daqueles por não caracterizar o inadimplemento, mas por impedir a própria contratação. Também o inciso VI impacta na execução contratual, através de comportamento do particular capaz de retardar o cumprimento do objeto da licitação sem motivo justificado. O inciso VIII, ao elencar como motivo de sanção a apresentação de documentação falsa, destaca a gravidade da atitude dolosa de pôr em risco a concretização da contratação ou a busca de privilégio antirrepublicano, ao obter o benefício público sem contemplar os requisitos legais. Já os incisos IX a XI dão destaque ao comportamento de fraude, que afasta os fornecedores capazes e compromete a igualdade e impessoalidade. Por fim, o inciso XII cuida dos atos efetiva ou presumidamente lesivos ao Estado, listados na lei anticorrupção. Destacam-se os comportamentos de superfaturamento nas compras e subfaturamento nas alienações.


No que tange à penalidades, o rol aqui é similar ao que previa o art. 87 da Lei nº 8.666/93, à exceção do impedimento de licitar e contratar com a Administração Pública, que veio a substituir a suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração. Percebe-se, nesta modificação, o intuito de corrigir equívoco na legislação anterior quanto à caracterização dos efeitos no emprego da penalidade, além da unificação sensata entre a sanção disposta na Lei nº 8.666/93 e aquela prevista no art. 7º, da Lei nº 10520/2000 (Lei do Pregão). A contradição entre as duas legislações exigia e exigirá até o término da vigência simultânea com a nova lei de licitações, uma interpretação sistemática que pode ser apreciada em artigo doutrinário.

Se por um lado, ainda foi possível identificar na nova lei o uso da técnica de tipificação abstrata (conceitos abertos e pouco determinados para certas práticas), percebe-se um avanço do ponto de vista de restringir a discricionariedade administrativa quanto à penalidade a ser aplicada caso identificada a conduta faltosa do contratado.

A lei disciplina, por exemplo, o uso da advertência exclusivamente quando o contratado der causa à inexecução parcial do contrato e desde que não se justifique a imposição de penalidade considerada mais grave. A penalidade de multa poderá ser aplicada por qualquer das infrações previstas no art. 154, mas limitada a um mínimo de 0,5% (cinco décimos por cento) e um máximo de 30% (trinta por cento) do valor do contrato.

A lei refere-se a dois tipos de multa: a cominatória do art. 155, II e a multa de mora do caput do art. 161. Ambas devem estar previstas expressamente no instrumento convocatório ou no contrato, assim como as condições para a sua aplicação. A redação do caput do art. 161 torna obrigatória a cobrança da multa de mora pelo órgão competente, que será o gestor do contrato. Nos termos do art. 155, § 8º poderá ser descontada do valor do pagamento devido pela Administração ao contratado e, não sendo suficiente, da garantia prestada, sendo possível também a sua cobrança judicial, independente da finalização do contrato. O parágrafo único do 161 contém regra de operacionalização da cobrança, momento no qual não há diferença entre as multas que podem ser cobradas como se fosse uma única causa, seja para o desconto na garantia, seja para execução fiscal. Daí se dizer que será convertida em multa cominatória somente para fins de cobrança. O mesmo parágrafo deixa clara a possibilidade de cumulação de sanções e da possibilidade de extinção unilateral do contrato. A extinção do contrato pode ser decorrência da realização de várias infrações ou de realização de infração grave.

A sanção de impedimento de licitar e contratar, por sua vez, será aplicada pelas infrações administrativas previstas nos incisos II, III, IV, V, VI e VII do caput do art. 154, quando não se justificar a imposição de penalidade mais grave. Tal sanção afasta o particular punido da participação em licitações e contratos tão somente no âmbito do ente federativo que tiver aplicado a sanção e o prazo máximo do impedimento é de 3 (três) anos, podendo ser justificado prazo menor pela Administração, a depender da conduta do particular.

Já a declaração de inidoneidade para licitar ou contratar será empregada quando da prática das infrações administrativas previstas nos incisos VIII, IX, X, XI e XII do caput do art. 154 ou pelas infrações administrativas previstas nos incisos II, III, IV, V, VI e VII do mesmo artigo (para as quais é prevista a sanção de impedimento de licitar e contratar inicialmente), caso se justifique a imposição de penalidade mais grave. Diante da gravidade que a medida exige, o legislador fixou os efeitos do impedimento ao particular de licitar ou contratar com a Administração Pública de todos os entes federativos, pelo prazo mínimo de 3 (três) anos e máximo de 6 (seis) anos.

Em todos os casos deve ser garantido ao particular o devido procedimento e a ampla defesa, nos termos do art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal de 1988 lembrando que o art. 3º, inciso III, da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, indica, entre os direitos do administrado, o de "formular alegações e apresentar documentos antes da decisão, os quais serão objeto de consideração pelo órgão competente".

Com o intuito de evitar duplicidade de sanção pelo mesmo comportamento, o art. 158 determina que as infrações cometidas que se enquadrarem na lei de licitações e na lei 12.846/2013 deverão ser apurados e julgados conjuntamente, nos mesmos autos, observados o rito procedimental e a autoridade competente definidos Lei.

Quanto ao critério temporal de aplicação das sanções, ao contrário das hipóteses de direito penal em que a prescrição se conta do fato, a nova lei inicia o prazo prescricional do conhecimento da infração. O prazo para a aplicação da sanção será de 5 anos, passados os quais ocorrerá a prescrição do direito de punir no contrato ou na licitação. Há previsão de fatores que ampliam o prazo apuratório: suspensão e interrupção. No primeiro caso, havendo acordo de leniência ou deferimento de liminar ou tutela judicial, o prazo se suspende, até que a situação se modifique, sendo retomada a contagem do prazo quanto ao restante ou quanto ao saldo Na hipótese de interrupção, o prazo volta ao início e há mais 5 anos para a apuração e aplicação da penalidade quando da abertura do processo administrativo apuratório.

Por fim, o PL admite a reabilitação do particular perante a autoridade que aplicou a penalidade, mediante a reparação do dano, o pagamento da multa e a instalação do programa de integridade, além de outros requisitos específicos para reabilitação previstos no ato punitivo e o transcurso do prazo mínimo de 1 (um) ano da aplicação da penalidade, no caso de impedimento de licitar e contratar, ou de 3 (três) anos da aplicação da penalidade, no caso de declaração de inidoneidade.

Além do prazo mínimo de cumprimento da penalidade, a lei inova ao aproveitar a reabilitação para incentivar a aplicação de protocolos de integridade que são preventivos de corrupção no âmbito corporativo privado. Nesse contexto, exige da empresa a se reabilitar o programa de integridade previsto na Lei nº 12.846/2013 justamente para prevenir novas causas de aplicação futura de declaração de inidoneidade.

Exige-se, ainda, parecer jurídico da procuradoria vinculada à autoridade para a validade do processo.

Feita a reabilitação, caberá a publicação da decisão ou resultado do processo no diário oficial e a posterior comunicação aos sistemas CEIS, CNEP e PNCP previstos nos artigos 161 e 174. Tais sistemas são de consulta obrigatória a fim de dar suporte à decisão do gestor de contratar ou não contratar, prorrogar ou não prorrogar. A consulta que já era obrigatória para a União Federal passa a ser obrigatória em todos os âmbitos da federação, seja na administração direta e indireta dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, por determinação da regra geral de licitações e contratos. Ademais, cria-se o dever de remeter os dados sobre a aplicação das sanções nos 15 dias úteis posteriores à aplicação.


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